A Fortaleza não tinha aristocracia, nem classes, e não sei se hoje tem; por modos que a florescente cidade poderia comparar-se a um organismo em formação, a uma semente fermentando, onde só o olho do sábio divisa o que terá de ser caule, folha e raiz.
Assim começa o romance A Afilhada, do escritor Manoel de Oliveira Paiva, que um pouco distante das glórias de José de Alencar com sua Iracema, é um dos muitos escritores esquecidos na nossa história literária (regional e nacional). Foi com esse parágrafo, no qual o livro se inicia nos apresentando o começo da modernização de Fortaleza no final do século XIX, que fui acertada na cabeça com toda a importância que Fortaleza tem pra mim e para a literatura cearense.
Em outro momento, farei uma newsletter sobre o livro.
Falar de Fortaleza faz parte do meu projeto literário. A capital cearense será cenário dos meus livros como personagem coadjuvante, uma coprotagonista.
No meu conto Este adorado sonho, usei Fortaleza também, e como um dos cenários a também histórica Praça dos Leões (desenvolvendo uma obsessão por praças?), no qual o personagem principal, em um fim de tarde após a escola, relembra o início e o fim de seu primeiro amor:
Na Praça General Tibúrcio, uma majestosa edificação neoclássica, conhecida pelos fortalezenses como Praça dos Leões por causa dos dois leões de bronze trazidos da França, Chico vê os amigos que já estavam ali o esperando, alheios a toda a história do lugar.
(...)
Tudo mudou tão rápido. A cidade inteira agora lhe parecia uma vitrine cruel de tudo que uma vez viveu e que já não era mais possível. Pelo menos não como antes. Seu coração, esse órgão de guardar vida, parecia não mais funcionar direito.
A Praça do Ferreira, no centro da cidade, é o cenário que abre meu romance (em processo de escrita). A praça é considerada o “coração” de Fortaleza. É histórica. Lá temos nosso cinema de rua, o Cineteatro São Luiz, ainda tão majestoso, inaugurado em 1958 pelo cearense Luiz Severiano Ribeiro. No outro lado da praça, temos o nosso primeiro arranha-céu, o Hotel Excelsior, inaugurado em 1931, e que ao longo dos seus 33 anos de funcionamento recebeu em sua arquitetura ao estilo Belle Époque a alta sociedade cearense, personalidades e artistas, e mesmo o presidente Juscelino Kubitschek. Hoje, distante de tanta glória, o espaço do hotel funciona com salas comerciais.
É na Praça do Ferreira que a história do meu primeiro romance se inicia, ambientado nos anos finais da década de 80. É na praça que outras tantas cenas e destinos se desenrolam. Um primeiro amor e suas descobertas, sonhos e desejos! É onde C. (meu personagem principal) e seus amigos arruaceiros sempre se divertem. Em outros cenários da cidade, C. e B. (personagem feminina principal) passeiam de moto pela orla da Beira-Mar, tomam sol na Ponte Metálica (ou Ponte dos Ingleses), construída no início do século XX. Esses serão alguns cenários do meu romance. Queria poder compartilhar tantas outras coisas, mas deixarei aqui apenas essas considerações para o momento.
Fortaleza é majestosa, cintilante, é de quentura, é de chuva, de natureza, de mares e jangadas. É minha, é de quem a visita. Não sou uma cidadã patriota em seu nível nacional, mas sou em nível regional.
Eu, a fortalezense!
Mais cearense do que brasileira. Sou pertencente a este lugar mais do que sou a este país. A este mundo tão imenso. E eu quero que vocês sintam isso no meu livro, nos textos em que Fortaleza estará em evidência, como caule, folha e raiz!
◖Indicações de livros, matérias, entretenimento, newsletters ou outros coisas
duas newsletters e o trecho de uma crônica sobre escrita
◖Precisamos mesmo escrever sobre todas as nossas ideias? Nara Vidal nos convida para uma reflexão com esse seu texto aqui;
◖A Liliane Prata fala sobre o excesso de informação;
◖Para pensar: esse trecho de uma crônica da escritora Chrysanthème, publicada no Correio Paulistano, em 1920, no qual falava sobre a repercussão do seu livro Flores Modernas:
Já notei que, para todo aquele que escreve e que procura fazer um pouco de psicologia nas suas linhas, o perigo está nessa própria psicologia, na qual teimam em se reconhecer umas centenas de pessoas.
(…)
É uma má propensão essa que leva assim o leitor a sempre se imaginar retratado nos livros que folheia e a querer, em idênticas circunstâncias, proceder como o personagem do romance fez, mesmo quando a isso o seu natural e o seu caráter se revoltam.
Esse popular e humano erro tem desnorteado muito cérebro fraco, muito espírito indeciso, muita imaginação exaltada e sem fixidez, impelindo a cometer ações censuráveis ou levianas entes que se conservavam, antes dessa leitura, num estado de torpor inofensivo ou de naturalidade serena.
Crônica recebida na coluna semanal da Editora Janela Amarela.
◖Na edição anterior de Tempo estranho
falei sobre os vermes malditos (filme) e os vermes malditos da nossa política
◖Você também me encontra aqui:
Até a próxima!
Já quero ler o livro!!!! Sabe que o roteiro de longa-metragem que estou desenvolvendo (de forma lenta kkk) se passa em Fortaleza.
Cidade mais linda e especial essa <3