Entre a esquerda e a direita, escolho Fortaleza
Observações sobre o cenário político de Fortaleza
Sempre votei no PT. Votei em Lula, no seu segundo mandato — ainda era criança no primeiro. Votei com orgulho em Dilma, nossa primeira mulher presidente. Votei em Haddad contra Bolsonaro. Votei em Lula contra Bolsonaro. Votei em Luiziane, a segunda mulher prefeita de Fortaleza, ela que nos prometeu uma Fortaleza Bela. Ela tentou? Eu acreditei. Votei em Camilo Santana para governador. Eu tenho muita simpatia pelo Camilo. Votei em Elmano (atual governador) que prometeu cuidar do nosso Estado. Ele tenta? Eu não acredito mais. Sua voz já não ecoa. Apenas a bandeira do PT o sustenta.
Eu nunca tinha ouvido falar em Evandro Leitão — candidato pelo PT para a prefeitura de Fortaleza — até essas eleições. E veja: ele é presidente da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará, nascido em Fortaleza, tem 57 anos, é deputado estadual desde 2015, tem formação em Ciências Econômicas e Direito, e para os que gostam de futebol, Evandro foi presidente do Ceará (Sporting Club) — importante time cearense e com destaque nacional.
Tudo isso tem na sua biografia.
Mas quem é Evandro? Ainda não sei. Nas primeiras pesquisas do primeiro turno, ele estava mal colocado, enquanto que dois bolsonaristas lideravam. Lula, com sua voz e presença retumbante, mudou o jogo. Deu seu apoio, visitas ao estado, pediu um voto de confiança no Partido dos Trabalhadores. Nós, o povo nordestino, somos. E muito.
O clima está tenso entre nós, eleitores. Fortaleza dividida tal qual o Brasil em 2018 e 2022. Conheço pessoas maravilhosas que vão votar no André Fernandes (PL), o outro candidato do segundo turno — que é um bolsonarista e contra os direitos das mulheres. Conheço pessoas sem caráter e que vão votar no Evandro Leitão (PT), são pela democracia. Vejam: a luta entre o “bem e o mal” só segue o roteiro nas narrativas ficcionais. Somos de carne, osso, sangue e suor, e não personagens inventados.
E vejam: as garras do bolsonarismo ainda cravadas na política com todas forças. Nunca nos livramos de Bolsonaro e temo que jamais nos livremos.
O meu voto nessas eleições é mais a favor da democracia do que no PT — que tem cometido falhas colossais! Votei em Evandro no primeiro turno me sentindo uma traidora da minha cidadania. Como disse, não conheço bem seu histórico, seu nome não me soava familiar — e que isso mude nos próximos quatro anos —, mas Evandro era o candidato mais viável da esquerda, orientação política que mais me identifico. Neste segundo turno, não há outro nome. Será Evandro outra vez. Mas tenho minhas dúvidas, minhas críticas. Não sou iludida ou muito menos otimista. Sou uma pessimista interessada no progresso da minha cidade.
Estudando a política cearense na década de 80, para escrever o meu romance juvenil, temos lá a primeira mulher prefeita, a socióloga Maria Luiza, do PT, cuja gestão está cheia de críticas — mulheres são mais duramente criticadas quando falham, bem sabemos. Temos Tasso Jereissati, empresário bem conhecido no cenário político, que venceu para governador, prometendo o progresso à Fortaleza, a tirando da influência dos coronéis que aqui dominaram por tanto tempo e a levando para o poder dos empresários. Depois vieram outros, como os Ferreiras Gomes — conhecidos como uma família “oligárquica” —, representados pelos irmãos Cid e Ciro (ex-governadores, Ciro também ex-prefeito). E depois tantos outros e PT de novo. Fortaleza sendo levada de um lado para o outro: pela direita, pelo centro e pela esquerda. Todos prometendo uma Fortaleza orgulhosa, bem vista, importante e moderna. Mas alguém já ousou de fato se importar com ela? A metrópole. A Terra da Luz. Bem localizada no Nordeste. A quarta maior capital do Brasil. Litorânea. Rica em cultura. Nossos políticos, de vez em quando querem embelezá-la. Passam maquiagem, mas ninguém a instrui. Ninguém lhe diz o certo e o errado. Que caminho deve tomar. Explorada até sangrar. Nossos ricos também não se importam. Vivem na bolha de suas áreas nobres, sempre bem tratadas, é claro.
Como já falei nessa última seção de Eu e a cidade, reforço aqui mais uma vez:
Fortaleza, essa desprezada. Ela própria que esconde seus feitos de nós mesmos, seus moradores. Ela tão desconhecida, uma “afilhada” com a qual poucos se importam, como bem me esclareceu Tiago Coutinho Parente com a sua dissertação2 de mestrado, na qual tenta desvendar a Fortaleza no romance de Oliveira Paiva:
Pois a Fortaleza de Oliveira Paiva convive com o contraste e parece que seus moradores não percebem. Seu moradores, na maioria das vezes, estão preocupados com o seu umbigo, seus desejos e sua promoção pessoal. As personagens não possuem a sensibilidade de seu autor. Às vezes, fico a pensar se a Fortaleza de Oliveira Paiva merece crescer. Talvez, mereça sempre ficar na mesquinharia onde se encontra, pois as pessoas que vivem nela não fizeram nada a favor do progresso, da civilização e, por fim, da coletividade.
(...) Minha Fortaleza, ninguém quer orientá-la, tal qual uma menina que não sabe o que fazer com seu “corpo” em desenvolvimento. Essa cidade que ainda parece presa numa puberdade centenária.
Obras inacabadas pela cidade. Promessas quebradas. Ameaças do "poder paralelo" estão pichadas em vários muros. Alguns dizem que já está tomada. Não há escapatória. Fortaleza violenta, sem lei. Estamos ferrados. E quem se importa? Os policiais nas ruas encenam uma segurança que não temos. Um celular roubado? Acho que isso nem deve ser mais medido pelo atual termômetro da violência urbana. E agora, quem irá nos defender? Infelizmente, o Chapolin Colorado não existe. Há um outro tom de vermelho-salvador no uniforme dos “heróis” do pobre, da classe trabalhadora, do nordestino. São os únicos que ainda nos dão algo para nos apegarmos. Essa é a realidade.
Há uma promessa vermelha que já fez IMENSO, mas não podemos viver de glorias passadas. Entre a esquerda e a direita, escolho Fortaleza.
O Partido dos Trabalhadores, que hoje detém o poder político na presidência, no governo do estado e possivelmente na prefeitura, precisa resgatar Fortaleza dos erros que eles mesmos cometeram, e, por responsabilidade de seus cargos, reparar os erros cometidos pelos outros.
E contra o fascismo delirante daquele que é contra os princípios democráticos, o candidato André Fernandes (PL) não pode ser o nome dos próximos quatro anos. Eu voto na oposição, em Evandro Leitão (PT). E torço para que a estrela que representa o Partido dos Trabalhadores não caia sobre nossas cabeças e desilumine Fortaleza ainda mais. Que a estrela, nessa nova chance, nos guie ao progresso, nos dê meios de levar adiante nosso papel no cenário nacional, mas, principalmente, no regional. Para nós, seus moradores.
Deixo para nós, fortalezenses, e para os governantes do estado/cidade/país essa mesma pergunta que Parente fez em sua tese:
Essa é uma dúvida minha hoje: por que as pessoas não gostam de Fortaleza? Por que elas não têm coragem de assumir esse bucho e tomar para si a responsabilidade dessa menina que cresce sem rumo?
Cidadãos fortalezenses que vão votar no domingo: a newsletter de hoje é um convite à conscientização que devemos ter sobre a nossa democracia. Com a nossa Fortaleza. Nossa casa. Nossa “menina” que ninguém aprendeu a cuidar.
Fortaleza é urgente!
◖Indicações de livros, matérias, entretenimento, newsletters ou outras coisas
cearenses indicados ao Prêmio Jabuti 2024, uma newsletter
◖Entre os semifinalistas do Prêmio Jabuti 2024, cinco são cearenses!!!
◖O Luri, do Puxadinho do Luri, e a importância da bondade;
◖Na edição anterior de A adulta
falei sobre algumas nostalgias dos anos 2000
◖Você também me encontra aqui:
Até a próxima!
Gostei do texto, votei com esse mesmo sentimento. Vc de algum livro, etc onde eu possa saber mais sobre a política cearense?
tão triste a desesperança que parece ter tomado conta da política brasileira em todos os níveis (federal, estadual e municipal), né? não discutimos propostas de cidade, estado ou país, estamos sempre votando no "menos pior", no "mal menor"...